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PORQUE SOMOS CONTRA A REFORMA DA PREVIDÊNCIA? | BC N.0 MARÇO DE 2019

PORQUE SOMOS CONTRA A REFORMA DA PREVIDÊNCIA? 
No ano passado, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado, presidida pelo senador Paulo Paim comprovou que o chamado rombo da previdência não existe. O que, sim, existem são dívidas astronômicas do setor empresarial com o caixa da seguridade.
O relatório CPI mostrou que, em quatro anos, os empresários descontaram R$ 125 bilhões dos trabalhadores e não repassaram para a Previdência, o que caracteriza roubo, um crime! O relatório aponta ainda dívidas dos patrões que somam R$ 450 bilhões.
O GOVERNO MANIPULA NOMES E NÚMEROS PARA ENGANAR O POVO
Mesmo assim, a seguridade social, não é deficitária. Quem diz isso é a ANFIP (Associação dos Auditores Fiscais da Previdência). Dados de 2015 demonstram que foi arrecadado em receitas R$ 694 bilhões e as despesas chegaram a R$ 683 bilhões, ou seja, R$ 11 bilhões de superávit, o que põe por terra o argumento de déficit.
A previdência pública sozinha arrecada mais com os seus contribuintes do que gasta com seus beneficiários (aposentados). E, quando chamam tudo de “previdência”, é porque querem tirar direitos tanto da previdência como da Seguridade Social.
A verdade é que o Sistema de Seguridade Social - que inclui a Previdência - responde também por uma infinidade de programas sociais, um conjunto de ações que foram criadas para auxiliar a vida dos trabalhadores e de suas famílias.
São programas que garantem, por exemplo, o seguro desemprego, a licença maternidade, auxílio por acidente de trabalho, auxílio reclusão, indenização por invalidez, doença, morte ou aposentadoria no final do período produtivo.
O governo fala em reforma da previdência, mas quer mexer no conjunto das ações da Seguridade Social que, assim como a Previdência Pública, são conquistas! Querem colocar tudo no mesmo saco para destruir todas elas! São dois os pontos principais que aparecem nas várias versões que “vazam”:
1. IDADE MÍNIMA
O governo não esconde a intenção de aumentar a idade mínima. São várias as propostas que circulam. Fala-se em fixar 65 anos tanto para homens como para mulheres. Outra possibilidade seria impor 62 para homens e 57 para mulheres. É a forma de fazer com que os trabalhadores fiquem mais tempo no mercado de trabalho e, portanto, pouco usufruam de sua aposentadoria. Muito mais gente trabalharia até morrer. Quem começa a trabalhar aos 18 anos, por exemplo, mesmo trabalhando e recolhendo por 35 anos sem interrupção, teria que esperar mais 12 anos para se aposentar. Os mais prejudicados seriam os trabalhadores de menor renda e os que começaram a trabalhar mais cedo, justamente os mais pobres.
2. CAPITALIZAÇÃO INDIVIDUAL
Aqui reside um dos ataques mais profundos. O atual sistema de previdência pública é baseado na repartição simples, ou seja, a contribuição solidária entre gerações, onde os atuais aposentados são sustentados pela contribuição dos trabalhadores que estão na ativa - mais a contribuição patronal obrigatória.O regime de capitalização individual defendido por Paulo Guedes (ministro da economia) é baseado no chamado “modelo chileno”, ou seja: acaba a previdência pública, cada um terá uma conta pessoal, com contribuição apenas dos trabalhadores e sem contrapartida da patronal. Caso ocorra qualquer problema com o fundo em que você aplicou ou ele quebre, o problema é seu.
Isso vai jogar todo o dinheiro das aposentadorias na esfera da especulação, ou seja, vai colocar o seu futuro nas mãos dos banqueiros. De novo, os mais prejudicados são os trabalhadores de menor renda e também todos os jovens que estão entrando ou vão entrar no mercado de trabalho.
No Chile, onde isso foi implantado, significou um achatamento brutal nas condições de vida dos aposentados. Você paga a vida toda e na hora de se aposentar seu saldo desaparece. Segundo a chilena Fundação Sol (dados de 2015), 90% dos aposentados recebem menos de R$ 694,00 enquanto o salário mínimo era de R$ 1.226. Lá, o índice de suicídio de aposentados é um dos maiores do mundo.
Entre os ataques previstos na PEC está o aumento da idade mínima de aposentadoria e do tempo de serviço para acesso ao benefício integral. Além disso, a proposta dificulta as regras para o acesso a benefícios como pensão por morte e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para as trabalhadoras mais pobres.
Pelas regras atuais, uma mulher de 55 anos e com 25 anos de contribuição teria de trabalhar mais cinco anos para se aposentar por idade e conseguir receber 100% da média salarial. Ou seja, estaria aposentada aos 60 anos de idade e com 30 anos de contribuição. No entanto, pelas regras de transição da PEC, essa mesma mulher terá que trabalhar mais sete anos para se aposentar por idade. Isso porque a reforma de Bolsonaro estabelece idade mínima de 62 anos para as trabalhadoras. Ainda assim, caso se aposente com 62 anos, essa mulher terá contribuído por 32 anos. Ou seja, pela mudança proposta, não terá direito a 100% da média salarial. Lembrando que 100% da média salarial estará limitado ao teto do RGPS.
De acordo com PEC, o benefício será de apenas 60% para quem atingir 20 anos de contribuição, acrescido de 2% por ano de contribuição que exceder esse tempo mínimo, até chegar a 100% com 40 anos de contribuição. No caso dessa trabalhadora, ela terá direito um benefício de apenas 84% do valor a que ela teria direito pela regra atual. Ou seja, 60% correspondente aos 20 anos, mais 24% referente aos 12 anos a mais de contribuição para se aposentar com 62 anos.
Para receber 100% da média salarial como aposentadoria, ela terá de contribuir por, pelo menos, 40 anos. Logo, precisará trabalhar até os 70 anos. A proposta desconsidera que as mulheres têm maior descontinuidade no tempo de contribuição. Que elas estão mais sujeitas a perda de emprego, em especial em caso gravidez.
Já no caso das trabalhadoras rurais, a reforma iguala a idade mínima de 60 anos para aposentadoria entre homens e mulheres. Nas regras atuais, mulheres do campo se aposentam com 55 anos, e homens com 60. Além disso, a PEC estabelece tempo mínimo de contribuição, 20 anos, que atualmente não existe. Pelas mudanças propostas, as trabalhadoras rurais não poderão mais se aposentar apenas por idade.
As trabalhadoras e trabalhadores rurais, na maioria das vezes, começam a trabalhar ainda crianças. Porém, poucas têm registrado o tempo de trabalho. Além disso, estão mais submetidas a duplas ou triplas jornadas de trabalho, nas atividades rurais e domésticas. Vale lembrar que as mulheres só ganharam o direito à aposentadoria rural a partir da Constituição de 1988. Até então, tinham direito a apenas meio salário mínimo, caso ficassem viúvas.
As alterações no acesso ao Benefício de Prestação Continuada, Pensão por morte e acúmulo integral das pensões e aposentadoria aprofundam ainda mais a desigualdade de gênero. Isso porque as mulheres representam a maioria que recebe esses benefícios.
Se a PEC for aprovada, a idade para acesso ao BPC, destinado pessoas em situação de miserabilidade, passará para 70 anos. A atual proposta reduz o valor do benefício, estipulando que seja de apenas 400 reais. O governo Bolsonaro quer ainda reduzir o valor da Pensão por Morte a 60% do salário + 10% por dependente menor de 21 anos, limitado 100% do valor. Isso pode fazer com que o benefício seja inferior ao salário mínimo.
Outra mudança que afetará diretamente as mulheres, em especial as mais velhas, é o fim da acumulação integral de aposentarias e pensões. A proposta prevê que a segurada terá que escolher o benefício de maior valor e, para receber o segundo benefício, haverá uma redução no pagamento. Para o segundo benefício, terá direito a até 80% do valor, caso o mesmo seja de até um salário mínimo. Quanto maior o valor, maior a redução que será calculada de maneira proporcional de acordo com as faixas correspondentes.
Por exemplo, se o benefício for R$ 1200,00, o valor será fatiado. O beneficiário receberá 80% de R$ 998 (salário mínimo), equivalentes a R$ 798,40. Além disso, terá 60% dos R$ 202 restantes. Ou seja, a faixa que vai de R$ 998 a R$ 1.200. Isso corresponderá a R$ 121,20. Somando essas duas parcelas, chegará ao valor total do benefício, de R$ 919,60. Outro exemplo, uma mulher que recebe R$ 1.800 e seu companheiro R$ 4.000. Atualmente, no caso da morte do marido ela tem direito a pensão integral. Com a reforma, porém, o valor da pensão seria 60% do salário do homem. Ou seja, R$ 2.400. Além disso, para acumular os benefícios, a mulher terá de escolher o maior (R$ 2.400) e receber uma fatia do menor, sua aposentadoria (R$ 1.800). Aplicando os percentuais previstos na PEC, a aposentadoria que ela receberia seria de R$ 1.279,60. Ou seja, acumulando os dois benefícios, ela teria direito a R$ 3.676,60 de benefício.
Esses ataques têm graves consequências para as mulheres trabalhadoras, porque elas são as que mais dependem dos benefícios. Em 2015, do total de dependentes que receberam pensão por morte, 84,4% eram mulheres e 15,6%, homens. Os benefícios assistenciais ao idoso, por sua vez, foram distribuídos em 58,5% para as mulheres e 41,5% para os homens. Os dados são do Anuário Estatístico da Previdência Social. Proporcionalmente, há mais mulheres protegidas pela Previdência Social do que homens. Porém, os valores dos benefícios pagos a elas são, em média, inferiores aos valores pagos a eles. Em dezembro de 2015, o valor médio dos benefícios ativos no Regime Geral de Previdência Social foi de R$ 1.101,13. A média dos benefícios pagos aos homens foi de R$ 1.260,41 e às mulheres de R$ 954,78. Ou seja, uma diferença de 32%.
Ainda segundo o Anuário de 2015, 7,4 milhões de pessoas receberam pensão por morte. Isso corresponde a 27,1% do total de benefícios previdenciários. Nesse contingente, 84% (ou 6,2 milhões) eram mulheres e 16% (ou 1,1 milhões), homens. Além das pessoas que receberam apenas pensão, 2,3 milhões (8% do total de beneficiários de previdência) acumularam benefícios de aposentadoria e pensão. Dessas, 84% eram mulheres e (ou 1,97milhões) e apenas 16% (ou 364 mil) homens.
Embora as mulheres sejam maioria entre os pensionistas, boa parte das pensões por morte recebidas por elas têm valor extremamente baixo. Em 2015, do total desse tipo de benefício destinado às mulheres, 53% eram de um salário mínimo 23% estavam na faixa de um a dois salários mínimos. Ou seja, três quartos das pensões por morte recebidas pelas mulheres não ultrapassavam dois salários mínimos.
Outro caráter excludente da reforma é a proposta de sistema de capitalização. Esse modelo individualiza a previdência e faz que o valor da aposentadoria de quem recebe menos seja desproporcionalmente menor. Segundo dados do IBGE de 2018, as mulheres ganham 22,5% a menos que os homens para exercerem as mesmas funções. A diferença salarial média entre uma mulher negra e um homem branco é de 60% podendo chegar a 80% em alguns cargos.
A CUT e as centrais sindicais já anunciaram que não aceitam qualquer mudança que diminua ou flexibilize os direitos contidos na seguridade social. São os banqueiros e especuladores que querem botar a mão no bolso da classe trabalhadora.
A hora é de organizar a resistência para defender nossas conquistas e não entrar no jogo dos inimigos com “emendas” ou “substitutivo”. É hora de, em cada sindicato, em cada local de trabalho, explicar o que pretende o governo e organizar a luta para defender a previdência pública e solidária.
É hora de dar todo apoio às lutas em curso, em especial dos servidores municipais da Capital de São Paulo que entraram em greve dia 04.02 pela revogação da reforma de sua previdência.
Adusp (Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo) e Informandes (informativo on-line do Andes – Sindicato Nacional)

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